A biografia
Acordar, passar o período das imagens
dos sonhos!... perceber-se limitado no universo do “real”. Acontece que a ordem
se inverteu com o personagem deste conto, e esta narrativa (por que não?!...)
fantástica me aparece como oportuna para a atual ocasião. Nem distante de sua
efeméride inicial, menos ainda perto de tal paralelo; Bernardo estava na suposta
“meia idade”. E houve o dia em que o seu sono foi temporário, mas o seu
despertar!... de súbito, um detalhe foi demasiado marcante para ser ignorado: em
suas mãos e seus braços, insetos de todas as espécies (ou eram, no mínimo, a
maioria da biodiversidade suprema de nosso planeta...) cobriam a epiderme de
nosso personagem. Era incrível a questão do espaço, pois era uma imensidão de
vidas minúsculas em um pequeno pedaço de carne humana... mas a sensação era de
um princípio jamais sentido anteriormente: era uma libertação física, uma
limpeza da alma com seres como formigas e baratas (!...). Acomodado com o
ocorrido nada previsível, o homem apenas permaneceu imóvel durante alguns
minutos; até que os insetos saíram de cima de sua pele, se uniram em uma nuvem
que se distanciou e se acabou com a chuva efêmera... Bernardo tentou se
aproximar da poça de água que se formou, mas quando chegou no solo em questão o
líquido não mais se fazia presente!...
E o nosso personagem ficou inerte,
com a companhia única da perplexidade; pensou em respostas, mas todas eram
vazias: não era um sonho, pois foi a extensão do porvir de um despertar
inquestionável; e não era verdadeiramente a morte, pois uma alma jamais
conseguiria se afastar por completo das demais!... as hipóteses da ciência
humana eram pequenas e inúteis para o contexto. Surgiu então um questionamento:
“Como posso arquitetar teorias internas sem qualquer outra presença humana ao
meu redor?!” Bernardo tentou achar respostas, mas nenhuma lhe veio à mente...
teve que aceitar que até o seu espírito individualista e misantropo era
resultado de um conjunto. Mas a sua vivência excêntrica não encontrou sua
peroração diante da construção daquele ponto...
E o que a atmosfera da dimensão, real
e ilusória, trazia ao homem!... não existia ali qualquer peso de consciência
(nem amargura e nem euforia desequilibrada!...), e o caminho oposto era um
universo nulo de purgatório (sem progressões e sem regressões...). Bernardo não
estava ali nem para aprender, nem para ensinar, construir ou destruir... era um
frenesi, uma constância sem escala de itinerário. Estava apenas sentindo o seu
heterônimo mais esclarecido, sem nenhuma crítica e/ou parcialidade. A escuridão
neutra que o cercava se fez presente até a próxima exposição surgir de uma
forte luz excêntrica;... uma sacada, sem andar para cima e nem para baixo,
estava um cidadão inquieto; em seu recanto solitário, seu olhar fitava tudo o
que lhe passava despercebido:
- Mas, ele sou eu!?... – Bernardo fez
o questionamento sem conseguir qualquer resposta contrária.
Se formulou então um estudo, um
autorreflexo sem hipocrisia e/ou catastrofismo; e percebeu que estava além do
bem e do mal, era pequeno e um detalhe grandioso... corrompeu-se às grades da
vaidade humana, Bernardo apenas analisava o seu Eu de Outrora. Mais nada
existia ao seu redor, estava livre de necessidades biológicas e do orgulho. Uma
forte ânsia de dar sinceras gargalhadas, a sua efígie nada mais era do que uma
ironia confusa perante o desconhecido!... estava fixo e inabalável, diante de
sua angústia exposta. Até que o ato de seu Eu fora de eixo se consistiu no
ignorar um outro indivíduo que lhe trazia vulto e o pedido de ajuda. E assim o
ciclo que permaneceu infindável se fez presente em seu espírito.
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